Os olhos ensonados fixaram-se na modorria do tecto asséptico. Do lado direito, uma daquelas traquitanas que espirram água em caso de incêndio. Do outro lado, uma espécie de candeeiro vomita uma espécie de luminosidade.
De súbito, um objecto escuro e barulhento rasga a quietude e alvura do cenário, desfaz em pedaços pensamentos libidinosos com suecas em topless a ordenhar vacas e precipita-se sobre mim.
Abro a boca. Não de espanto, mas porque a isso sou obrigado.
Indefeso e submisso. Desejando que tudo acabe depressa.
Como é que vim parar aqui?
Abro a boca. Não de espanto, mas porque a isso sou obrigado.
Indefeso e submisso. Desejando que tudo acabe depressa.
Como é que vim parar aqui?
***
Não deve haver coisa mais fascinante no mundo, do que acordar cedo numa manhã de sexta-feira 13 para ir ao dentista.
A última vez tinha sido há ano e meio, o que significa que já consigo obrigar-me a ir ao dentista, mais ou menos regularmente. Mais ou menos.
Não sou daquelas pessoas que têm medo de ir ao dentista.
De todo.Eu tenho é medo de ir a qualquer médico, nem que seja só para ir lá dar-lhe um abraço. E um dia que morra, vou estar a tremer de medo por causa da autópsia. Sou bem capaz de morrer outra vez, se for caso disso!!
E, então, lá foi o JP ao dentista, numa sexta-feira 13, com o único objectivo de não desmaiar desta vez.
Antes, já tinha inspeccionado a bocarra, em ridículas sessões de boca aberta encostado ao espelho que retribuía a imagem de um palhaço a embaciar um espelho.
Não via nada.No entanto, chegado à cadeira do dentista, que por acaso é uma dentista, uma auditoria às contas da minha câmara dentária, revelou uma irregularidade.
Não é caso para destituir o executivo, mas há um vereador que precisa de ser posto na ordem.É o melhor eufemismo que encontro para dizer que tenho de arranjar um dente. Um pré-molar. Meio doentinho por dento.
Nada denunciador por fora.
O malandro.
Nada denunciador por fora.
O malandro.
Pois podemos.
Yupi.
Até diria que estou a espumar-me de felicidade , mas não, é das merdas que me está a pôr dentro da boca. Não, não a levo a mal. É o seu trabalho. Na minha boca.
Chama-se à coisa, "Destartarização". Que é como quem diz, retirar pedaços de tartaruga que se alojaram na dentadura. Parece que temos de lavar os dentes depois das refeições e antes de ir para a cama, ou as malditas tartarugas atacam a dentição humana.
Além de lavar os dentes regularmente, continuo a viver num 3º andar e ainda estou para saber como é que hordas de tartarugas selvagens sobem lá acima para atacar a boca do menino durante o soninho...
Vamos então à destartarização.
Vrummm! Swich! Swich!
Entra em acção brocas, espátulas de metal brilhante e até chaves de fenda se tiver de ser.
De tudo a dentista deita a mão para combater o tártaro da vítima, perdão, do paciente.
E, de facto, é preciso ser paciente para aguentar meia hora de escarafunchanço mecânico. Isto deve ser mais ou menos o que eu sentiria se fosse uma mina em Aljustrel...
Basicamente abre-se a boca e esguicha-se sangue. É como que pagar para levar um murro nos beiços. Mas medicamente assistido, deitado em cadeirão reclinável, com televisão na SIC Notícias. Com estilo.
Enquanto se engole uma mistela de tártaro, sangue e sei lá mais o quê.
E as máquinas fizeram "Fzzzzimmm!!"
E eu respondi "Blurp... Glup... Blurp..."
Na sala ao lado, o outro dentista daquele consultório que, só para distrair quem ali vai, é ainda sobrinho ou primo, ou lá o que é, do Ramalho Eanes, entretém o melhor que pode um gaiato de oito anos...
- Estás com medo?
- Não.
"Não?!" Fedelho armado em bom.
Pois eu estou com medo.
Doutor!! Aqui!! Deste lado!! EU tenho medo! O que é que eu ganho?
Fziiiimm... Rummmmmmmmmmmmmmm....
Parece que acabou. Cá fora, fecho os olhos ao sol que me beija as pálpebras em miminhos cósmicos.
Parece que saí incólume daquela sala de tortura.
Foi só uma limpeza de tártaro, mas sinto-me mais corajoso que Átila, o Huno.
Próxima sessão de sado-masoquismo marcada só para Setembro, já que a dentadura, digo ditadora, digo doutora, vai de férias.
Tempo para esquecer a minha crónica hipocondria, o medo e até as superstições.
Até porque 11 de Setembro, além de ser 11 e não 13, "não calha" a uma sexta-feira.
Não há espaço para mais superstições e...
11 de Setembro???
Nããããããããooooooooooo!!!!!!!!!
Yupi.
Até diria que estou a espumar-me de felicidade , mas não, é das merdas que me está a pôr dentro da boca. Não, não a levo a mal. É o seu trabalho. Na minha boca.
Chama-se à coisa, "Destartarização". Que é como quem diz, retirar pedaços de tartaruga que se alojaram na dentadura. Parece que temos de lavar os dentes depois das refeições e antes de ir para a cama, ou as malditas tartarugas atacam a dentição humana.
Além de lavar os dentes regularmente, continuo a viver num 3º andar e ainda estou para saber como é que hordas de tartarugas selvagens sobem lá acima para atacar a boca do menino durante o soninho...
Vamos então à destartarização.
Vrummm! Swich! Swich!
Entra em acção brocas, espátulas de metal brilhante e até chaves de fenda se tiver de ser.
De tudo a dentista deita a mão para combater o tártaro da vítima, perdão, do paciente.
E, de facto, é preciso ser paciente para aguentar meia hora de escarafunchanço mecânico. Isto deve ser mais ou menos o que eu sentiria se fosse uma mina em Aljustrel...
Basicamente abre-se a boca e esguicha-se sangue. É como que pagar para levar um murro nos beiços. Mas medicamente assistido, deitado em cadeirão reclinável, com televisão na SIC Notícias. Com estilo.
Enquanto se engole uma mistela de tártaro, sangue e sei lá mais o quê.
E as máquinas fizeram "Fzzzzimmm!!"
E eu respondi "Blurp... Glup... Blurp..."
Na sala ao lado, o outro dentista daquele consultório que, só para distrair quem ali vai, é ainda sobrinho ou primo, ou lá o que é, do Ramalho Eanes, entretém o melhor que pode um gaiato de oito anos...
- Estás com medo?
- Não.
"Não?!" Fedelho armado em bom.
Pois eu estou com medo.
Doutor!! Aqui!! Deste lado!! EU tenho medo! O que é que eu ganho?
Fziiiimm... Rummmmmmmmmmmmmmm....
Parece que acabou. Cá fora, fecho os olhos ao sol que me beija as pálpebras em miminhos cósmicos.
Parece que saí incólume daquela sala de tortura.
Foi só uma limpeza de tártaro, mas sinto-me mais corajoso que Átila, o Huno.
Próxima sessão de sado-masoquismo marcada só para Setembro, já que a dentadura, digo ditadora, digo doutora, vai de férias.
Tempo para esquecer a minha crónica hipocondria, o medo e até as superstições.
Até porque 11 de Setembro, além de ser 11 e não 13, "não calha" a uma sexta-feira.
Não há espaço para mais superstições e...
11 de Setembro???
Nããããããããooooooooooo!!!!!!!!!
6 comentários:
Mariquinhas!!...
:-)
Quem diz é quem é!!
E, além do mais, não assina!
Mariquinhas e covarde!!
E não tenho medo de si, porque vou chamar o meu pai!!
Manguito para si!!!
Toma!!!
Hilariante, delicioso, lindo, fantástico! Estás perdoado por tirar três dias de férias do "brogue".
Ouve lá, eu tenho uma amiga dentista que era capaz de te tirar o medo. Que tal?
Demorou mas valeu a pena. Esta história lembrou-me uma questão que me persegue há muito tempo, a propósito de dentistas: porque será que, mal apanham um desgraçado de boca aberta e cheia de ferros e rolos de algodão, desatam a fazer perguntas? Não sabem que nos entupiram e escancararam a boca e isso nos impossibilita de responder? Não sabem que já estamos suficientemente aterrorizados e em posição inferior, para ainda nos achincalharem mais?
Isto prova a minha tese de que para se ser dentista tem que se ser um bocado sádico, e para se lá ir tem que se ser um bocado masoquista.
E pronto, já disse, aproveitando ter a boca livre de entulho.
Bjs
Ana
Madalena:
Não me digas que essa tua amiga dentista atende o pessoal em lingerie!!!
Isso é bem capaz de tirar o medo, mas continua a ser algo susceptível de deixar de boca aberta...
Beijos.
Ana:
Às vezes o medo bloqueia o pensamento.
Só isso explica o facto de esquecermos que podemos nos
defender... à dentada!!!
Beijos.
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