143Era um Verão quente, ainda sem laivos de tropicalismo como os do início deste milénio. Estávamos em plenos anos 80 e "papai e mamãe", acorrentados à rotina, lufa-lufa e horários escrupulosos de duas multi-nacionais que já não têm fábricas em Portugal, contrataram uma jovem empregada para fazer umas limpezas lá em casa, pelo menos uma vez por semana.Eu tinha 14 anos e entusiasmava-me cada vez mais com decotes e rabos de saias. Só que, paradigma dos adolescentes mais introvertidos, dedicava-me muito mais a intermináveis sessões onomásticas, do que aos imponderáveis engates junto do sexo oposto.
E assim, naqueles tempos em que o sangue fervia e se concentrava todo no mesmo sítio, as terças-feiras galoparam velozmente os degraus do ranking dos melhores dias da semana.
Nas terças à tarde, ficava sozinho em casa com a jovem empregada da limpeza. Era morena, tinha olhos castanhos e um corpo cheio de curvas, tantas como a sinuosidade atrevida do seu sorriso. Temperava as palavras com pimenta e canela, consoante queria ser mais provocadora ou mais doce e meiga.
Tinha 21 anos e ia casar daí a dois meses com um trolha sortudo, que iria levar aquele espectáculo de mulher para casa. Um autêntico
Festrolha para o qual não estava convidado.
Não me lembro se limpava bem ou mal, nem sequer como se chamava, mas lembro-me que a presença dela era um autêntico pau de dois bicos. Literalmente.
Isto porque, depois de tanto falar dela, tinha deixado de ser o único vulcão pronto a explodir naquela ilha dos amores. O meu jovem primo Carlitos, absolutamente imberbe nos seus 11, 12 anos, mas disposto a ganhar asas e saltar todas as etapas de uma adolescência que só lhe atrasava o desejo de ser adulto, também por ali sobrevoava a flor que se adivinhava de pólen agridoce.
Nesses doces anos, um tal de Adam Curry apresentava um saudoso Countdown nas tardes do segundo canal e por ali passavam outras tentações da época como esta
loura ou esta
morena. E tal como entoava um jingle de então, o calor apertava e a sede despertava. Tanto que, na minha cabeça, ideias mais ousadas fervilharam, ao mesmo tempo que, mais abaixo, valores mais altos se levantaram.
Foi então que, com o calor como aliado, convenci a sexy gata borralheira a libertar-se de alguma roupa. E ela prescindiu do avental. Sorria evocando o pecado, enquanto eu engolia em seco. Consegui ainda balbuciar qualquer coisa sobre a sua camisa de algodão, como estava ali a mais, que não viria mal ao mundo se ela se pusesse à vontade e fizesse o seu trabalho de limpeza em soutien... E ela despiu a camisa.Ouviram-se sinos em catedrais feitas de cristal! Fadas montadas em unicórnios prateados entoaram mantras eróticos! O sol, lá fora, piscava numa palete de neons!
E, num completo desprezo pela poética das coisas, o meu pirilau mordia as calças de ganga, ameçando ser livre, serpente voraz em busca da presa!
E ela? Ela exultava embriagada pelo seu poder de sedução e estava disposta a estender a mesa de jogo até lhe faltarem as peças. E era ela a jogar...
- E agora? É melhor tirar mais alguma coisa?Não consegui articular uma sílaba, mas os braços finalmente responderam às ordens do cérebro e levantaram-se titubeantes...
Tocaram à campainha.
Ela precipitou-se para a camisa pendurada na cadeira.
- Espera!! Deixa-me ver quem é!!
Nervoso, com o coração a mil, amaldiçoava a minha má sorte, enquanto espreitava do 3º andar lá para baixo. Era o primo, claro. Um autêntico Peninha na vida de um Donald azarado.
- É o meu primo! - gritei para dentro de casa.
E quando entrei com ele, por incrível que pareça, ela continuava a mesma visão de sonho. Uma morena de soutien negro, espanador na mão, sorriso matreiro, olhar matador.
- O que é que ela está a fazer, só de soutien? - perguntou um Carlitos de olhos arregalados.
- Ann.. então, ummmm... é porque estava calor e ...
E não havia mais nada a dizer. A imagem da bela empregada desvanecia-se como miragem, embora continuasse ali, meio despida, sorridente, à espera das próximas jogadas.
Mas não aconteceu mais nada e como estava na hora dos meus pais chegarem, ela vestiu-se.
Foi a sua última terça-feira na minha casa.
No sábado seguinte ela casou e nunca mais a vi até hoje.