13 fevereiro 2009

Recordações de um Amor Azarado


Hoje é sexta-feira 13, amanhã Dia dos Namorados e inevitavelmente lembro-me dela.
Eu tinha 18 anos, ela 16.
Partilhávamos a sala de aula e a sala dos meus pais.
E doses monumentais de azar.

A minha vida mudou quando comecei a namorar a Rita e não foi para melhor.
A miúda era um gato preto com mamas.
Um espelho partido com pernas.
Uma eterna sexta-feira 13.

A culpa é minha porque não soube interpretar os primeiros sinais.
Logo ao primeiro beijo, estava na cara que aquela relação não ia dar certo.
E quando escrevo "na cara" poderia ser mais rigoroso e escrever, "estava no lábio".
Foram 15 dias a passear um herpes do tamanho de um esquilo e, parecendo que não, este é o género de incidente que mina a auto-confiança da adolescência.

O "Não Há Estrelas No Céu", de Rui Veloso, fala de poucos amigos e de muitas borbulhas mas não menciona herpes do tamanho de esquilos, transmitidos por namoradas amaldiçoadas.
Não pescas nada disto, Carlos Tê.
Adiante.

Com o tempo, à custa de muita borracha mandada para o ferro-velho do Jacinto, fui percebendo que as saídas de carro não eram boa ideia.
Invariavelmente um pneu explodia numa qualquer descida da Serra da Arrábida que gostávamos de frequentar.
Ela pela paisagem, eu porque achava que ali os riscos associados à sua má sorte eram mínimos.
Não estava a prever aquela derrocada em Março, mas pronto.

A Rita tornou-se a minha kriptonite.
Tudo corria mal e eu fraquejava, sucumbia à demência, amedrontava-me até quando baixava as calças para mijar atrás de um arbusto, julgando que a qualquer momento dali poderia sair um coiote esfaimado por morangos silvestres.

Antes do Verão já eu andava completamente desnorteado com a Rita e decidido a ganhar coragem para acabar com tudo, no sentido literal de "acabar com tudo".

Enquanto não ganhava tomates para exterminar o resto da horta, tomei algumas precauções perto da Rita.

Assim que a via, batia três vezes num pedaço de madeira, nem que fosse a perna de pau do Custódio, aquela mesmo que foi comida por térmitas dois anos depois numa noite de campismo nos arredores de Marraquexe.

Aos sábados de manhã ia ao campo procurar trevos de quatro folhas e aos domingos, na missa, pedia perdão a Deus para o pecado iminente que ganhava volume no meu pensamento e que consistia em ir à quintinha do avô do Ruben amputar patas de coelho.
Pecado que não cheguei a cometer, descansem os protectores dos animais e os criadores do Bugs Bunny, do Roger Rabbit e o Hugh Hefner que criou o coelho malandro da Playboy.

Na rua, evitava que a Rita se cruzasse à minha frente, em casa retirei os espelhos, na cama evitava posições que me obrigassem a passar por debaixo da escada, digo, por debaixo dela.

Tentei tudo: jogar um dos seus sapatos de salto alto, por cima do ombro, virar 65 budas de costas, pendurar espanta-espíritos, chamar um exorcista e nada, nada, nada.
Nicles.
Rien.

Até que, numa tarde quente de Agosto, a Rita apareceu morta numa mata da Lourinhã.
O corpo boiava numa poça de sangue.
Uma estaca espetada no coração.
Ninguém soube o que aconteceu, o caso está arquivado.

Foi há muito tempo, mas sempre que acontece uma sexta-feira 13, ou um dia de S. Valentim, ou ainda pior quando uma coisa é véspera da outra coisa, não sei porquê, tenho tendência para passar 20 minutos na casa de banho, a lavar as mãos.

4 comentários:

Ana Paula Motta disse...

Ui que horror!! Esse é mesmo um post de sexta-feira 13. Tinha que ser mesmo em agosto esse fim trágico, afinal é chamado o "mês do cachorro louco"...

Marie Tourvel disse...

Coitada da Rita. :(

Vim lhe fazer uma visita, querido colega do Porta do Vento. ;)

Um beijo, Marie

João Paulo Cardoso disse...

Ana Paula Motta:

Agosto é o "mês do cachorro louco"?

Estão explicados os devaneios do meu caniche, sacana do bicho.

Beijos.

João Paulo Cardoso disse...

Marie Tourvel:

Muito obrigado pela visita!
Será retribuída em breve, prometo.

Beijos.